Temos tecnologia e ciência para conter um retrovírus, porque
não estamos usando? Uma cidade isolada não precisa passar pelo que iremos sofrer.
As grandes crises requerem a ação de grandes homens, líderes que mereçam ter o
epiteto. Numa sociedade em que anões morais governam tudo está em slow motion,
tudo propositalmente lento demais, cenográfico demais e com muita dubiedade.
Parauapebas
não precisa sacrificar 300 dos seus habitantes pela falta covarde de sua
liderança. Podemos fazer a contenção viral, ainda há tempo, mas a gestão
precisa se abrir para os outros e ouvir. É hora de salvação e temos um plano de
trabalho que pode ajudar a cidade a reduzir danos já que permitiram por
preguiça ou desconhecimento o covid 19 se instalar.
Não
adianta preparar leitos, comprar ventiladores, construir hospitais de campanha
e deixar a tragédia acontecer. Precisamos agir. Não há tempo para hesitações ou
gastos sem direção, talento e estratégia.
Vejam
porque escrevo algo que me deprime e me assusta: pela pantomina dos fatos, pela
posição de quem pagamos caro para cuidar de nós.
Esses
acontecimentos iniciam segunda feira, dia 14 de abril:
Desde
segunda feira, um paciente que chegou de São Luís, em casa com todos os
sintomas do Covid 19, todos, procurou atendimento no plano de saúde, receitou medicamento,
não deu diagnostico e o enviou para casa,
Esse
paciente é um amigo, trabalha numa grande empresa, é branco, inteligente e tem
esposa e filhos,
Durante
toda a noite de segunda pra terça, os incômodos continuaram, vômitos, dor de
cabeça, febre e continuam o dia todo, enquanto faço as seguintes tentativas
todas em vão:
Ligo
para uma enfermeira conceituada e respeitada na comunidade, nada. Suas recomendações
são para o paciente ir ao hospital.
Quando
falo que é para onde ele não deve ir, ela pede um tempo.
Retorna
mandando eu ligar pra o SAMU, PORQUE HÃO HÁ NENHUMA LOGÍSTICA OU PENSAMENTO OU
ESTRUTURA PARA ATENDIMENTOS QUE NÃO SEJAM NO HOSPITAL. E isso é sério e grave,
vejam bem, um hospital que não é exclusivo para o covid 19. Onde todas as
pessoas com outros problemas estão,
Onde
médicos e pessoal de saúde transitam sem proteção estão. E que para ser
transportado vai expor outras pessoas pelo caminho.
Ligo
para uma vereadora, pedindo socorro, apresento o problema e peço ajuda. Ela tenta,
esforça, mas retorna com a mesma recomendação da enfermeira, para procurar o
SAMU.
Percebo
nessa segunda tentativa que a ordem é procurar o SAMU que nem controlado pela
gestão é. Tudo depende de Marabá, começo então a entender de fato o quanto
estamos perdidos e refaço meus cálculos para o quantos irão morrer à míngua em
Parauapebas.
Enquanto
isso o paciente piora, mais febre, mais vômitos, mais dor de cabeça, dores pelo
corpo, desanimo, cansaço. Os remédios receitados por seu plano de saúde já não servem.
As dores corporais aumentam.
Apavorado
ligo pro prefeito da cidade, através de seu homem de confiança. Que atende e tenta
o contato e retorna com a velha desculpa que o mandatário perdeu seu fone e
assim não pode atender. Não, não há interesse.
O
paciente piora, se isola ainda mais,
Hoje
sinto que é o limite, ligo no SAMU em Maraba, de lá controlam as ambulâncias daqui,
a ligação ruim, o excesso de perguntas, a mal compreensão da demanda, o
desinteresse pela doença, a falta de preparo, o total desrespeito e a ausência de
humanidade me fazem desligar e procurar amigos locais,
Recorro
a três amigos, que me pediram para não citar seus nomes porque são políticos,
candidatos e temem retaliações. Eles tentam e não conseguem fazer nada, O
PACIENTE PIORANDO. Um deles entende de SAMU e me explica que o problema é que
tudo é controlado por lá e recomenda levar o paciente ao hospital. Impressionante
a insistência para o paciente ir justamente para onde não deve, o hospital
comum e único da cidade.
Um
deles me informa que tem um telefone para esse tipo de caso e me manda falar com
o outro, ele me manda um fone, Sema 33461020 – 1778/3809, ligo pro primeiro,
cai no hospital municipal, falo do caso, me respondem a mesma coisa, para ir
até lá, não tem informações de ambulância interna, ligar SAMU novamente:
desespero ante a frieza e falta de preparo em frente a crise de saúde, a
atendente me repassa o setor PRÓPRIO, ME DEPARO FALANDO NA VIGILÂNCIA SANITÁRIA.
Ao falar a atendente um pouco mais preparada me repassa para o CENTRO DE
CONTROLE EPIDEMIOLÓGICO, olha bem, cinco setores da prefeitura municipal que
não estão nem ai para a crise epidemiológica no município. A ligação cai e não sou
atendido novamente.
Depois
esses meus amigos, tentando ajudar me repassa mais HMP 33468532/8533 e Centro de
Saúde Ocupacional 33463370 que pressinto não adiantar ligar e desisto.
O
paciente está esperando no leito, sozinho em casa, eu resolver um veículo para
busca-lo, de forma que não contamine mais ninguém, que o busque dentro dos parâmetros
da Organização Mundial de Saúde e do Ministério da Saúde Federal.
Estou
quase desistindo e levando o paciente no meu carro, vou fazer mais uma ligação
pro SAMU agora no horário de almoço deve ser mais tranquilo e poderei resolver
ou ouvir a ligação.
Quando
falo em citar os nomes de todos que apareceram aqui, um deles me pede para não citar,
porque pode complicar as relações políticas deles aqui. Nem pergunto todos, porque sei a
merda que são as relações em Parauapebas.
Ligo novamente no SAMU em Marabá e agora
a atendente (outra) faz os procedimentos rapidamente e me repassa ao médico
para me atender “porque ela não entende o que vou falar”. ELE atende e de
imediato fala que não pode autorizar deslocamentos de ambulâncias e que passará
o atendimento para Dr. Fulano esse poderá autorizar.
Mas tenho a mais amarga surpresa dessa
manhã, ele me pergunta se sou o paciente, digo não, ele pergunta se estou próximo
ao paciente, digo que lógico que não, o paciente esteve em São Luiz, chegou de
lá há quatorze dias e está doente e acamado, logico que eu nem poderia estar próximo,
ele insiste E COVARDEMENTE DECRETA QUE poderia atender somente se falasse com o
paciente ou se o mesmo ligasse para pedir socorro.
Não acreditando comento que desse jeito
estamos perdidos e ele confirma pra mim:
sim, muita gente vai morrer mesmo. Mas só atende se o próprio paciente
ligar.
Penso e se o paciente estiver morto, mas
percebo que ele maldosamente não quer ajudar. Ele ainda afirma que naquele
momento ele tinha doze pedidos na frente do meu.
Imaginei se o paciente estivesse morto
como eu pediria para ele mesmo ligar, quase chorei de dor e decepção por
respirar o mesmo ar que esse pessoal insensível e que entendem que estão eles e
os seus próximos fora da zona da morte.
Desliguei decepcionado e entendendo
porque a mortandade em curso revela ainda mais o covarde caráter da nossa sociedade
que dissemina o mal nas vestes de crenças e de fé.
Entendi também a tranquila atitude do
prefeito municipal que decreta confinamento horizontal e estado de emergência e
que não dispõem nem de uma ambulância para buscar enfermos, que não ouve seus próprios
especialistas em como conduzir uma crise dessa que chegou em proporções bíblicas,
se escondendo e mentindo para sua massa, massa que vai morrer ou perder seus entes
queridos.
Morrer por despreparo de quem elegeu.
Ao terminar este texto recebo a notícia
de dezesseis casos confirmados. Agora imagina, até dia 16 de março não havia quaisquer
ação por parte da prefeitura. Foi necessário a vereadora Joelma aceitar meu
texto (aqui) e dar o alerta.
Há menos de trinta dias e já colecionamos
16 casos. E 3 mortes.
Imaginem a extensão da tragédia em
curso. Meus cálculos apontam para 300 mortes ou estado grave somente aqui em
Parauapebas.
Mortes à míngua, sem contar a fome, o isolamento,
o preconceito e a falta total de suporte porque não temos nada. Nem ninguém.
Muito bom texto, serviu bem pra contextualizar a realidade...
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